quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Se eu fosse um cavalo

O documentarismo social é uma corrente fotográfica que depende da existência dum olhar empático em relação aos seus sujeitos. Para o inglês Ian Beesley, esta premissa base nunca foi um problema. Quando começou a fotografar o operariado britânico, espécie em vias de extinção nos finais do século vinte, não o fazia com o olhar de um estranho. Não o fazia porque, pura e simplesmente, era um deles.

Concluíra a sua escolaridade básica em Bradford, em 1972, sem ter tido acesso a qualquer tipo de formação artística, vítima de um ensino e de um sistema de opções orientado para uma certa visão de sociedade. Aos filhos de operários, futuros operários, não se via qualquer necessidade de lhes alimentar devaneios culturais.

Após os estudos básicos fora trabalhar para uma fábrica têxtil,  depois para uma fundição e, finalmente para a central municipal de tratamento de resíduos de Esholt , em Bradford. Foi a trabalhar aí que conseguiu juntar dinheiro para comprar a sua primeira câmara. E foi aí que começou a usá-la, retratando o local e os seus colegas.

Estranhamente, foi também em  Esholt, num ambiente que classifica hoje de dickensiano, rodeado de sujidade e de gente endurecida pela vida, que encontrou estímulo para seguir adiante. Bob Rowell, o capataz da equipa em que estava integrado, um homem duro, sem paciência para ronhas, que combatera na segunda guerra mundial e que a cada momento demonstrava que a inteligência não dependia da escolaridade, disse-lhe, olhando para as suas primeiras imagens, que quem fotografava assim devia esforçar-se para entrar numa academia de artes. E todos os outros concordaram que não devia ficar encalhado alí.

Apesar da ausência de uma formação específica, o portefólio que elaborou então conseguiu convencer o júri de admissão do Bradford Art College. E Beesley cumpriu o vaticínio dos seus colegas. O operário de  Esholt tornou-se um fotógrafo. Um fotógrafo com um olhar muito agudo sobre as realidades sociais.

Ian Beesley, Capataz após receber carta de dispensa,1977
imagem obtida aqui
Pouco tempo depois, em 1977, Ian (que não perdera o contacto com os seus antigos camaradas) soube que a central ia fechar.
Retornou de imediato para registar a ocasião e o lugar. Nos balneários, encontrou Bob Rowell sentado. Pensou que estivesse a descansar e fotografou-o. Ouvindo disparo da câmara, o homem olhou para cima e Ian Beesley pôde perceber que Rowell estivera a chorar.
Perguntando o que se passara, obteve como resposta que, após trinta anos de serviço, o velho capataz acabara de receber a carta de dispensa. " É o fim. Se eu fosse um cavalo, davam-me um tiro", disse-lhe Bob.
Quando Beesley se desculpou por o estar a fotografar nesse momento, este disse-lhe que não tivesse problemas. Fotografar era agora o seu trabalho.

Leia mais neste artigo do Guardian.

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