sexta-feira, 25 de março de 2011

Os rostos banais do Mal

Em 1945, o mundo assombrou-se com a natureza e a escala do extermínio nazi. O fotógrafo britânico George Rodger acompanhava as primeiras tropas que entraram no campo de concentração de Bergen-Belsen e fotografou os sobreviventes esquálidos e as pilhas de cadáveres que chocaram os próprios libertadores, tropas experientes e que já haviam visto muito.

Após a rendição alemã, os dirigentes nacional-socialistas detidos pelos aliados foram julgados pelos crimes contra a humanidade nos chamados Julgamentos de Nuremberga.
Capturado nesse período, Adolf Eichmann, o responsável pela logística e execução do extermínio judeu, evadir-se-á e fugirá para a Argentina. Descoberto, será raptado por uma unidade da MOSSAD, os serviços secretos isralelitas, e levado para Israel em 1960. Em abril do ano seguinte, iniciar-se-á o seu julgamento que durará até Dezembro.
A filósofa judia alemã Hannah Arendt, entretanto naturalizada norte-americana, acompanhou as sessões e cobriu o evento para a revista The New Yorker. Deste facto viria a nascer o livro Eichmann in Jerusalem, onde observa que os perpetradores do holocausto não eram seres de evidentes características demoniacas, monstros, óbvias encarnações do mal, mas antes indíviduos boçal e terrivelmente normais. Formaliza no livro o conceito de "Banalidade do Mal", assente no facto da sistematização do Mal não assentar predominantemente na excepcionalidade dos seus agentes, mas no desvio organizacional e na criação de uma ordem que os descupabiliza e isenta. Pacatos cidadãos, pequenos burocratas, ex-comerciantes, foram estes os executores do Mal.

Contemporâneos dos nazis, e seus aliados bélicos, os militares que dirigiam o Japão nas décadas de trinta e quarenta, construiram também eles um sistema que desumanizava e descupabilizava os seus membros. O domínio japonês, nas áreas que controlou nesse período, reflectiu-se igualmente num mortícinio elevado e gratuito, assente não num ideário de extermínio racial (ao contrário dos alemães), mas num profundo desprezo cultivado relativamente aos dominados.

Após a rendição japonesa, as tropas aliadas procederam, também neste teatro de operações, à detenção dos suspeitos de participação em crimes de guerra e contra a Humanidade. O seu julgamento é menos conhecido e divulgado que o dos seus correspondentes europeus, mas americanos, britânicos e australianos julgaram e condenaram um elevado número de militares japoneses.
O Australian War Memorial conserva as fotografias dos suspeitos nipónicos. Estas imagens, realizadas por militares para fins processuais, não nos espantam por questões estéticas ou técnicas. Há nelas essa estranha evidência de normalidade que constatou Hannah Arendt. Estes homens que, à semelhança de Eichmann, declararam não ter culpa, ter apenas seguido as ordens, são os rostos banais do Mal.


Sgt. R. L. Stewart, Sub-Oficial Masao Matsuda, Amboina, Ilhas Molucas,1945
imagem obtida aqui


Sgt. R. L. Stewart, Sargento-ajudante Tatsushi Hiwaki, Amboina, Ilhas Molucas,1945
imagem obtida aqui



Sgt. R. L. Stewart, Sub-Oficial Nasashi Tanaka, Amboina, Ilhas Molucas,1945
imagem obtida aqui

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