terça-feira, 9 de março de 2010

Apatetada nostalgia

Vários factos levam-me a acreditar que há nos portugueses uma obsessão quanto ao olhar e à opinião dos outros.
Nunca vivi fora e quem conheço proximamente partilha a minha condição nacional. Não sei, por isso, se os outros povos reagem com igual exagero ao juízo estrangeiro. Oscilamos entre o sentimento de ofensa profunda e a adulação. O que dizem de nós, ou é a verdade absoluta, inquestionável, ou uma distorção mal intencionada. Raramente acolhemos observações externas com indiferença ou análise.
Dito isto, e a contracorrente, tenho de dizer que uma das imagens que mais se adequam à ideia do País da minha infância é justamente de um estrangeiro.
A fotografia de Josef Koudelka, de 1976, apresenta-me, de uma forma que não sei explicar bem, esse Portugal subitamente cortado do Império, atávico e a querer ser moderno.
O país das EFSes e Fameles, do leite não pasteurizado, vendido em bilhas nas traseira de triciclos. De carroças de mula coloridas, com sinetas, a transportar areia para obras de betão armado. Uma terra de minis Morris, citroens dois cavalos e renaults 4L. De Unidades Colectivas de Produção e de uma barragem que não se construía, porra. Enfim, o lugar dos garrafões de vinho, dos carapaus fritos e das feijoadas à beira-mar.
Um Portugal, em larga medida, desaparecido, do qual, estranhamente e por vezes, sinto uma apatetada nostalgia.
 
Josef Koudelka, Portugal, 1976

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