sexta-feira, 21 de fevereiro de 2014

Melodrama, faca e alguidar

A canadiana Kourtney Roy, a par duma bem sucedida carreira na fotografia de moda, desenvolve desde os seus tempos universitários uma série de auto-retratos, onde combina referências aos melodramas cinematográficos dos anos cinquenta, e ao cinema de terror, com um não disfarçado interesse pelo universo Kitsch.

Kourtney Roy, Auto-retrato, sem data

imagem obtida aqui


Kourtney Roy, Auto-retrato, sem data

imagem obtida aqui


Kourtney Roy, Auto-retrato, sem data

imagem obtida aqui

Kourtney Roy, Auto-retrato, sem data

imagem obtida aqui

Kourtney Roy, Auto-retrato, sem data

imagem obtida aqui

Kourtney Roy, Auto-retrato, sem data

imagem obtida aqui

Kourtney Roy, Auto-retrato, sem data

imagem obtida aqui

Kourtney Roy, Auto-retrato, sem data

imagem obtida aqui

Kourtney Roy, Auto-retrato, sem data

imagem obtida aqui

Kourtney Roy, Auto-retrato, sem data

imagem obtida aqui



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sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Coração vagaroso

Dizem que tenho um coração negro, de pedra.
Mas tu conheces-me melhor.
Sabes que é de carne. Sangue e músculo, sobretudo.

Mas têm alguma razão.
O meu coração não é normal.
É vagaroso, bate lento, num pathos sereno.

Só quando te acercas é que funciona com ritmo de gente…




Júlio Assis Ribeiro, SP_M_CRÇPDR_01, 2014
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quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

O Homem que desmentiu Descartes

O francês René Descartes foi um pensador que, no século XVII, desenvolveu um conjunto de teorias no campo da filosofia e da Matemática. Teorias que se revelam decisivas na ultrapassagem do pensamento escolástico vindo da idade Média tardia, e na instituição do paradigma moderno.
Entre muitas outras coisas,defendia que era o acto de pensar que constituía ontologicamente o Homem, e que esse acto não provinha da componente corporal, e animal, mas antes da alma."Assim, pela razão de não podermos conceber de modo nenhum que o corpo pense, estamos justificados em acreditar que toda a espécie de pensamento em nós existente pertence à alma.", lê-se a dada altura na sua obra "Paixões da Alma". O mundo do pensamento constituía-se assim à parte das sensações e das emoções.

Em 1994, o neurologista António Damásio, investigador e professor da University of Southern California, nos Estados-Unidos, pôs em causa este dualismo mente/corpo usando argumentos fisiológicos. A sua pesquisa centrou-se no estudo do cérebro em funcionamento usando moderno equipamento de imagiologia médica. Porém o seu ponto de partida não foi exactamente uma novidade, um caso recente. Na verdade, partiu do estudo da vítima dum insólito acidente de trabalho em 1848. 
Nessa data, Phineas Gage, de 25 anos, era capataz de uma equipa que trabalhava na construção de caminhos de ferro na Nova Inglaterra. Numa das muitas explosões que tinha que levar a cabo para abrir caminho, o jovem capataz foi atingido por uma barra de ferro que lhe trespassa o crânio. Apesar da gravidade do ferimento, e da perda de um olho, sobreviveu e recuperou.

No entanto, o seu carácter ficou irremediavelmente alterado. O responsável e competente Phineas Gage tornou-se um homem de comportamento errático, incapaz de tomar decisões, que destruiu a sua vida profissional, familiar e social em pouco tempo.

O seu caso foi alvo de atenção médica e, desde então, foi visto como exemplo, e prova, da relação entre lesões cerebrais e alterações de personalidade. Seis anos após a sua morte, em 1866 o seu crânio foi recolhido e encaminhado para a Universidade de Harvard onde se encontra depositado, conjuntamente com o varão de ferro que o mutilou, no Warren Anatomical Museum.

J B S Jackson,
Crânio de Phineas Cage e varão de ferro,
E.U.A., 1870
imagem obtida aqui
Analisando o crânio de Cage, Damásio concluiu que o ferimento afectara o chamado Córtex pré-frontal, zona que controla a personalidade e a emotividade. O que, no entanto, impressionou o neurologista não foi propriamente a alteração da personalidade, mas antes os aspectos funcionais em que esta se fez sentir. Embora mantivesse intactas as capacidades de linguagem e de raciocínio, o sobrevivente Phineas Gage era incapaz de manter um comportamento racional. E tal levou António Damásio a concluir que Razão e Emoção não se constituem independentemente, sendo, pelo contrário,  indissociáveis. O postulado cartesiano de Razão como coisa unicamente da Alma ficava assim posto em causa.

Durante muitos anos pensou-se que as únicas imagens de Phineas Cage que era possível obter eram as reconstruções elaboradas a partir do crânio. Mas em 2009, um daguerreótipo, até então erradamente tido como representando um baleeiro com arpão, foi identificado como sendo um retrato seu. O objecto que segurava não era um arpão excêntrico, era simplesmente a barra de ferro que o atingira no famoso acidente.

Autor não Identificado,
Phineas Cage,
E.U.A, sem data
imagem obtida aqui
Esta identificação foi confirmada por comparação morfológica com o crânio, e no ano seguinte, uma segunda imagem, uma provável cópia em papel de um outro daguerreótipo desaparecido,  descoberta nos espólio da família Cage comprovou definitivamente a veracidade da atribuição.

Autor não Identificado,
Phineas Cage,
E.U.A., sem data
imagem obtida aqui

As fotografias agora descobertas terão sido feitas pouco tempo após o acidente, a avaliar pelo aspecto jovem de Phineas, e numa mesma sessão. Terão sido feitas quando a fotografia era uma técnica ainda na infância, presa a dificuldades técnicas e a convenções que nos são hoje um pouco estranhas. Mas permitem-nos viajar no tempo e vislumbrar o operário que, sem o saber ou o desejar, desmentiu Descartes.

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sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

A beleza acidental de Arnold Odermatt

Num primeiro momento, para Arnold Odermatt estava destinada uma vida de padeiro e pasteleiro. Acabaria, no entanto, polícia. Chefe de polícia mesmo. Mas nunca abandonaria a minúcia do artesão nos seus quarenta anos de serviço e, convertido à Fotografia, conseguiu extrair dos acidentes automóveis que registou uma beleza inesperada.

Leia mais aqui.


© Arnold Odermatt,
sem título,
Stans, Suíça, 1973
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quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

A história boa demais

Vivian Mayer,
auto-retrato,
E.U.A., sem data
imagem obtida aqui

Vivian Mayer é a história boa demais para ser verdade. É a descoberta que todos gostaríamos de ter feito.

Uma americana meio-francesa, meio austríaca, que passou pela vida anónima. Que viveu trabalhando como ama a maior parte da sua vida, sem grandes amizades, com cara de poucos amigos. Uma solitária que desaparecia aos domingos, e nas férias, carregando as suas máquinas fotográficas.

Uma mulher que nos deixou algumas caixas num contentor de armazenamento, daqueles que os americanos usam para guardar as suas coisas quando perdem as casas, mudam de Estado ou vão para um lar. Caixas que foram leiloadas por falta de pagamento das instalações e que, por obra do acaso, foram resgatadas da destruição, do desmantelamento e da perda, numa feira de rua por John Maloof.

Qual arca de Fernando Pessoa, as caixas de Vivian Mayer revelaram um tesouro que parece não ter fim. No seu interior, estava o registo de uma das mais fulminantes, e cáusticas, caçadoras de imagens do século XX.
Preto no branco e a cores.

Vivian Mayer,
Sem título,
Canadá, 1950-60
imagem obtida aqui


Vivian Mayer,
Sem título,
Chicago, E.U.A., Maio de 1970

imagem obtida aqui


Vivian Mayer,
Sem título,
Chicago, sem data
imagem obtida 
aqui

Vivian Mayer,
Sem título,
Nova Iorque, E.U.A., 24 de Dezembro de 1953
imagem obtida 
aqui

Vivian Mayer,
Sem título,
Chicago, E.U.A., Agosto de 1975
imagem obtida 
aqui
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domingo, 29 de dezembro de 2013

A graçola e o seu oposto

Um fotógrafo americano não identificado, em 1900, decidiu-se por uma graçola. Com a cumplicidade dum carteiro e dos pais duma criança também não identificada, compôs um momento ridículo para os nossos fugazes sorrisos: colocou a criança, que nos fita com um olhar surpreendido, na mala do carteiro (que nos fita também com um olhar a dar para o surpreendido).

Autor desconhecido,
Carteiro com criança,
E.U.A., 1900
imagem obtida aqui
Mas como a realidade tende a ultrapassar (pela direita) a ficção, quando os correios americanos lançaram em 1913 o seu serviço de encomendas, esta encenação deixou de ter graça para os responsáveis dos serviços postais dos Estados Unidos.
A ideia de despachar de forma económica crianças interessou a mais pessoas do que se poderia prever. E apesar certamente da oposição dos funcionários, há o registo de pelo menos três situações em que crianças foram expedidas com selos colados à roupa, e levadas de comboio e camião até ao seu destino pelos correios americanos.
Surpreendida, forçada pela realidade, e definitivamente descrente das virtudes do bom senso, a direcção postal americana fez publicar regulamentação que proibia explicitamente o fenómeno. Passou a ser proibido, na letra da lei, e até hoje, o envio de crianças pelo correio.

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domingo, 15 de dezembro de 2013

Retrato duma personagem

Praticar o chamado retrato psicológico, um exercício complexo em que se tenta capturar numa fotografia os traços da personalidade do retratado, é algo que frequentemente se revela difícil.
Por vezes, descamba mesmo para o impossível, quando o alvo da lente é alguém que, na sua presença, se transfigura e se transforma numa personagem.

Este defeito, atribuído comummente a secções muito especificas e especializadas, como os actores e os políticos, quase como uma deformação profissional, atinge  situações limite. Situações em que quase se duvida da existência duma verdadeira personalidade atrás da personagem.

Refiro-me a figuras cuja aparição em público implica, ou implicava, sempre uma encenação. Andy Warhol era um desses casos. Outro, sem dúvida, era Salvador Dali.
Ambos tinham uma relação forte com a sua representação fotográfica, ambos forneceram o material visual para alguns dos mais fantásticos retratos do século vinte. Mas, quase sem excepção, o que forneceram não foi um vislumbre do seu pathos ou da sua verdade interior. O que ofereciam à câmara era uma manipulação.

Perante este facto, por vezes a melhor abordagem que um fotógrafo podia ter era hiperbolizar o que o modelo oferecia, tornar evidente essa manipulação.

Alberto Schommer, Salvador Dali, 1973
imagem obtida aqui
E Alberto Schommer, fotógrafo espanhol, sabia-o. Por isso fê-lo tão bem tão bem em 1973.

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