terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

O Registo empático

Não são muito numerosas as representações realistas de trabalhadores manuais na era pioneira da fotografia, nos tempos do daguerreótipo e do calótipo.
Por um lado, pesavam as dificuldades técnicas, com as emulsões pouco sensíveis e as ópticas pouco luminosas a dificultarem a prática fotográfica em ambiente laborais movimentados, frequentemente mal iluminados. Por outro lado, considerações económicas tornavam a Fotografia, enquanto prática profissional, algo muito preso ao retrato encomendado, refém das aspirações e gostos de uma clientela pagante. Por último, esteticamente a fotografia encontrava-se presa a determinados padrões herdados da pintura, que não privilegiavam o realismo de Courbet e afins. Muitos dos profissionais eram pintores retratistas de qualidade secundária que transitaram para a fotografia, por verem nela uma oportunidade de negócio que destronaria a sua actividade tradicional. As representações de trabalhadores em acção nesses primeiros anos resultam sobretudo da prática de amadores, curiosos de registarem o mundo com o seu passatempo. Nos Estados Unidos da América, onde a estratificação social não era tão acentuada quanto na Europa, e onde o acesso ao retrato foi mais rápido do que na Europa, a realização de retratos de artesãos por fotógrafos profissionais não era invulgar. Mas estes, regra geral, ou se faziam retratar omitindo a sua condição, como burgueses com as suas melhores roupas, ou a sua profissão eram abordada por via iconográfica, com os retratados estáticos junto às ferramentas do seu ofício.

Autor desconhecido, Canteiro, Estados Unidos da América,1850s
imagem obtida aqui


Autor desconhecido, Relojoeiro, Estados Unidos da América,1850s
imagem obtida aqui



A Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos, no seu sítio destinado à colecção de daguerreótipos, reserva uma secção expressamente para estes retratos.Nela destaca-se a fotografia de um serralheiro especializado em fechaduras (locksmith). Bem antes de Jacob Riis, de Lewis Hine e de Dorothea Lange, vislumbra-se na imagem um interesse pela objectividade do mundo laboral e pelos seus agentes. Pela postura corporal, fisionomia do retratado e estado da roupa entende-se que o enfoque do autor não girou em torno de códigos, da construção de uma representação, mas antes em empatia com a realidade.
 
 

Autor desconhecido, Serralheiro (locksmith), Estados Unidos da América,1850s
imagem obtida aqui

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