A fotografia, da estrutura das barracas de Birkenau, reaviva a memória da minha própria passagem pelo megacampo de Auschwitz, na Polónia.
Quem lá for pela primeira vez poderá pensar ingenuamente que, imunizado por leituras e documentários, se pode sair livre de choques e surpresas.
Mas, mesmo nas visitas guiadas a passo acelerado que o museu proporciona, raro é o estreante que abandona o complexo sem se sentir abalado.
Todos sabemos coisas acerca do Holocausto nazi. Alguns, como eu, leram Primo Levi e Imre Kertez, cronistas da rara sobrevivência nos campos de concentração. Outros não esqueceram A Lista de Schindler, ou as aulas de História do seu ensino secundário.
Porém, provavelmente, ninguém está a par de tudo acerca da Solução Final de Hitler. A dimensão e a natureza do Mal patente no complexo de Auschwitz é avassaladora, e o mais "preparado" dos excursionistas é atropelado, ou pelos pormenores que desconhecia, ou pela crua confrontação directa com as provas.
Num corredor dum dos edifícios de Auschwitz, os visitantes são expostos a um aspecto perturbador, mas central do projecto de extermínio. Dezenas de fotografias de prisioneiros dos primeiros tempos do complexo estão penduradas nas paredes. Rostos retirados dos cadastros do campo, de pastas com imagens de frente, perfil e três-quartos, organizadas pelo aparelho contabilístico/burocrático que fazia tudo funcionar com eficiência fabril .
Junto às imagens, informações mínimas acerca dos retratados. Dentro destas, destacam-se duas: a data de entrada e data da morte. Separam-nas, por norma, poucas semanas.
O campo estava projectado para extrair dos condenados o máximo de trabalho, com o mínimo de investimento (comida, roupa, alojamento), em menos de cem dias. Nesse período, os prisioneiros, ainda saudáveis nas fotos do dia da sua entrada, seriam esgotados enquanto mão de obra e convertidos em matéria-prima.
Wilhelm Brasse,
Fotografia do cadastro da prisioneira 22193,
Auschwitz, Polónia
Arquivo do Auschwitz-Birkenau State Museum
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Erich Hartmann, no projecto In the camps, esquiva-se a fotografar o portão de Auschwitz que contem a célebre "Arbeit macht Frei"- o Trabalho liberta ( ver A mais cínica das frases). Mas, numa das barracas de Birkenau, repara nas vigas e fotografa-as. Decoram-nas alguns slogans.
Num campo em que as condições de alimentação e higiene faziam morrer muitos dos prisioneiros por disenteria e tifo, o vigamento de um dos edifícios recebia-os não só com incentivos à honestidade, à ordem e à boa postura, como com um pérfido Sauberkeit ist Gesundheit - a Limpeza é Saúde.
Erich Hartmann, Slogans em vigas,
Auschwitz, Polónia, 1994
imagem obtida aqui
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Erich Hartmann,
Ehrlich währt am längsten -
a Honestidade é a melhor política,
pormenor de "Slogans em vigas",
Auschwitz, Polónia, 1994
imagem obtida aqui
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Erich Hartmann,
Sauberkeit ist Gesundheit - a Limpeza é Saúde,
pormenor de "Slogans em vigas",
Auschwitz, Polónia, 1994
imagem obtida aqui
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