segunda-feira, 29 de novembro de 2010

SPECIMEN - O Dia da Naftalina


Júlio Assis Ribeiro, SP_A_TRÇ_01 - Traça, 2010


O bicho é aquilo a que chamam traça. Alguns chamam-lhe também mariposa. E já ouvi meterem-na no mesmo saco das borboletas, embora não ponha, quando em descanso, as asas ao alto.

Têm uma fama terrível as traças. Acusam-nas de comer roupa.
Confesso que nunca vi nenhuma a almoçar uma camisola ou um par de meias, mas juram-me que sim, que as desgraçadas se refastelam de algodão e lã. Até agora, por observação directa, culpo apenas as suas larvas de dizimarem aquilo que pomposamente chamo "O Meu Relvado", porque em resposta costumo tratar-lhes eu da saúde com um granulado que me empesta o quintal por alguns dias.
Mas retornando à roupa, da fama não se livram, e eram as responsáveis por um dia especial que acontecia duas vezes por ano.
Na mudança de estação, no primeiro mais quente ou mais frio, invadia as escolas onde estudei um cheiro adocicado. Em resposta à metereologia, muitos iam buscar roupas que haviam sido resguardadas em roupeiros e arcas, onde as mães, por claros maus instintos, tentavam impedir as comensais de se alimentarem com umas bolas brancas,venenosas, de cheiro forte, que amíúde se põem igualmente nos urinois públicos para disfarçarem o fedor ( conseguindo um inimitável bouquet, mistura sábia de vários pivetes).
Não sou senhor de um bom nariz. Desgraçadamente, essa minha protuberância fecha metade do ano  para obras, por alergias, e pensava que esta memória estudantil, se calhar, era criação mental minha. Mas, conversando com alguns companheiros da época, concluí que não. Todos se lembram daqueles dias de roupa subitamente agarrada das catacumbas, sem direito a lavagem profiláctica. Todos se lembram do Dia da Naftalina.

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domingo, 21 de novembro de 2010

ONTOS - Um atum da Madeira em Oxford

De entre a enorme gama de fenómenos que encontramos na Internet, e que incorrem na categoria de coisas simultaneamente patetas e sérias, existe um jogo intitulado The Oracle of Bacon, criado por Brett Tjaden. Esta pequena maravilha consiste simplesmente num único princípio, o de ser possível relacionar alguém, qualquer pessoa, que tenha tido um qualquer papel na indústria do cinema, com o actor norte-americano Kevin Bacon, em não mais de seis passos. O objectivo do jogo é, obviamente, conseguir fazer essa ligação. E, se possível, num número mais curto de passos.
O interessante é que algo que parece um óptimo exemplo de um produto destinado a queimar tempo de forma orgulhosamente fútil se baseia num estudo sobre a interacção humana , assente em várias experiencias conduzidas por Stanley Milgram e outros investigadores, sobre as redes sociais nos estados unidos, e que conduziram à chamada Teoria do Mundo Pequeno. Esta  parece confirmar cientificamente o velho lugar-comum de “O mundo é pequeno” e diz-nos que em sociedades abertas é possível relacionar qualquer dos seus membros em não mais de seis graus.
Este avanço científico glorifica formas absolutamente parvas de relacionar factos, e abre-nos todo um mundo novo de possibilidades sem que nos possam apontar um dedo acusador. Ao fim e ao cabo estamos a demonstrar o nosso muito douto know-how sociológico.

Um exemplo. Como se pode relacionar um pescador madeirense do século dezanove com a Alice do país das maravilhas?
É fácil! Em meados do século dezanove, pescadores madeirenses capturaram um atum que foi comprado por Henry Acland, médico e professor inglês que se encontrava na ilha acompanhando o paciente e amigo Henry Liddell, deão do Colégio universitário Christ Church, em Oxford. O deão encontrava-se na ilha, à semelhança de muitos dos seus conterrâneos abastados, por motivos de saúde, fugindo à agressividade do inverno britânico. Henry Acland adquire o enorme peixe e providencia que seja encaminhado para Oxford onde, depois de liberto das partes moles, será objecto de estudo nas aulas de anatomia de Christ Church. Actualmente, à semelhança de outras recolhas de Henry Acland, encontra-se ainda na cidade universatária inglesa, no Natural History Museum. Em 1857, Acland solicita ao jovem professor de matemática Charles Dodgson, que se dedicava à recente arte da Fotografia, que registasse o esqueleto do atum.

Charles Dodgson, Esqueleto de Atum, Oxford, 1857
imagem obtida aqui
 
Charles Dodgson fotografará o esqueleto e, mais tarde, fotografará igualmente a filha de Acland, Sarah Angelina Acland, e as crianças do deão de Christ Church, Henry Lidell.
As filhas de Lidell serão, aliás, durante algum tempo os seus modelos de eleição. E uma delas em particular, Alice Lidell, ficará para sempre ligada ao jovem matemático, muito embora essa ligação tenha sido mais tarde minorada por este. Nos passeios e expedições fotográficas que foram feitas, para entretenimento das crianças Dodgson desenvolveu uma narrativa em que estas são personagens. Por insistência de Alice, acabará por fazer um manuscrito com essa narrativa para lhe oferecer. E mais tarde desenvolverá, e apurará, a história, que será publicada com o título de “Alice in Wonderland”, assinada com o seu pseudónimo literário, Lewis Carrol.

E é assim que, aparvalhadamente, se liga um anónimo pescador madeirense a Alice no País das maravilhas em quatro passos.

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terça-feira, 16 de novembro de 2010

A Madeira a cores (5)


Sarah Angelina Acland, Navio na baía do Funchal, Autocromo, Madeira, 1908-1915
imagem obtida aqui

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ONTOS - Pena de Pavão

As penas de pavão entraram, aí pelos anos sessenta e setenta, num certo imaginário decorativo, entre o freak e kitsch. No início do século vinte, porém, não creio que trouxessem tais evocações, e seriam vistas como um bom motivo para aplicar as nascentes técnicas fotográficas a cores.

Autor não identificado, pena de pavão, diapositivo Paget, início do século vinte
imagem obtida aqui

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domingo, 14 de novembro de 2010

ONTOS - Três ovos de Cuco

Sarah Angelina Acland fotografou (além da ilha da Madeira, de plantas e jardins, e de conhecidos) alguns especímenes científicos, animais embalsamados e, como é o caso, ovos recolhidos em saídas de campo.


Sarah Angelina Acland, Três ovos de pássaro, Diapositivo autocromo, 1908-1915
imagem obtida aqui

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sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Lendo - Rómulo de carvalho

Tive, quando miúdo, um ou outro professor que me falou com um certo fascínio de um homem chamado Rómulo de Carvalho, que assinava António Gedeão enquanto poeta, e que além de fazer versos se dedicava a ensinar (bem) ciências no Liceu Pedro Nunes, em Lisboa.
Tenho encontrado pelas escolas que vou percorrendo como docente, nas bibliotecas, um pequeno livro publicado em 1960 que é precisamente escrito por ele. Por ser de carácter didactico, a obra foi assinada com o nome próprio e não com o pseudónimo literário. História da Fotografia é o seu título, e encontro-a quase sempre desgastada, a desfazer-se, sinal de fraca constituição, de papel baratinho e edição popular. Mas também indício de muito uso e interesse.
E percebe-se porquê. Apesar de ser uma história da Fotografia que se centra nos olhar de um cientista, concentrada nos seus processos químicos e físicos, nos avanços técnicos e em que abundam nomes como brometo, nitrato, albumina, colódio, mercúrio. E onde não há referências a Cartier Bresson, Capa ou Man Ray . Sim,  apesar disso, percebe-se. Lê-se com entusiasmo.
Rómulo apresenta pormenores invulgares e episódios rocambulescos, torna a criação da nova técnica ( esta história concentra-se sobretudo no século dezanove) uma aventura empolgante. Poder-se-á apontar-lhe um excessivo centramento nos desenvolvimentos de origem francesa, o que se compreende observando a bibliografia. Mas francamente, tal não interessa muito se se pretende uma pequena História da fotografia que se leia dum ápice e que entusiasme quem nada conhece de químicos e de fotografia.
Recomendo-a aos meus alunos, sem medos das lacunas e da data de publicação, e gostaria de contribuir para o já acentuado desgaste dos pobres livros. Que se edite de novo...

























Rómulo de Carvalho, História da Fotografia,colecção Ciência pra gente jovem,
Ed. Atlântida, Coimbra, 1960

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quinta-feira, 11 de novembro de 2010

A madeira a cores (4)



Sarah Angelina Acland, Casa com trepadeiras, Madeira, Autocromo, 1908-1915
imagem obtida aqui


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terça-feira, 9 de novembro de 2010

A madeira a cores (3)
























Sarah Angelina Acland, Jardim com rede de dormir, Madeira, Autocromo, 1908-1915
imagem obtida aqui

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segunda-feira, 8 de novembro de 2010

ONTOS - Phronima sedentaria

Um pequeno crustáceo, Phronima sedentaria, deambula no fundo do mar inserido no corpos cilindricos e vazios de tunicatos mortos. Os adultos da espécie depositam os seus juvenis no interior destes receptáculos.
Diz-se que o Phronima obteve razões acrescidas de interesse por ter inspirado H.R. Giger na criação do monstro extraterreste da série de filmes ALIEN, iniciada com filme homónimo de Ridley Scott.

I. MacDonald,Phronima sedentaria, 2009
imagem obtida aqui

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A Madeira a cores (2)
























Sarah Angelina Acland, Auto-retrato com guitarra e cão, Oxford,
Autocromo,1908-15
imagem obtida aqui

 A maior parte da obra fotográfica de sarah Angelina Acland encontra-se presentemente à guarda do Museum of the History of Science, em Oxford, Inglaterra. Este espólio foi parcialmente digitalizado e é possível a consulta de imagens de baixa resolução através da Internet. Um bom exemplo a ser seguido, em Portugal, por quem guarda e zela documentos fotográficos que caíram fora do âmbito dos direitos de autor. Facilita-se o conhecimento e a investigação- coisas, como se sabe, de pouca importância...
A imagem abaixo é parte dessa obra, e trata-se de um autocromo, de cerca de 1908, com uma vista do Funchal.

Sarah Angelina Acland, Vista do Funchal,Madeira, Autocromo, cerca de 1908 imagem obtida aqui

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domingo, 7 de novembro de 2010

A Madeira a cores

Sarah Angelina Acland nasceu a 26 de Junho de 1849, em Oxford, Inglaterra. O pai, Sir Henry Wentworth Acland, foi um importante professor desta cidade universitária que, conjuntamente com o deão Henry Lidell ( de quem era médico pessoal), ajudou a revitalizar a instituição universitária. Promoveu a criação de uma colecção que permitisse impulsionar os estudos das Ciências Naturais, e deve-se a ele, em grande medida a criação do Oxford University Museum.

Angelina cresce num ambiente onde notórias figuras da cultura e ciência da segunda metade do século dezanove se movimentam e cruzam, e travará conhecimento com muitas delas, nomeadamente John Ruskin, amigo intimo da família. Manter-se-á sempre solteira, gerindo a casa do pai após o falecimento da mãe, Sarah Cotton, em 1878. Depois da morte de Henry Acland, desempenhará diversas actividades beneméritas e, mercê duma confortável situação económica, gozará de uma evidente independência, livre das correntes obrigações da vida familiar.

O contacto com a Fotografia terá provavelmente sido muito precoce dado que o pai, à semelhança de muitos cientistas da época, foi um praticante desta novidade técnica. Foi igualmente uma das muitas crianças fotografadas por Charles Dodgson ( Lewis carroll). Em 1892, tornou-se uma executante de fotografia, facto raro, mas não único, entre as mulheres da sociedade vitoriana. Porém, o que em larga medida distinguirá Sarah Acland, será o pendor experimentalista. Praticará processos técnicos de grande grau de complexidade- trabalhará a platinotípia e será uma pioneira da fotografia a cores. Colaborará com Sanger Shepherd no desenvolvimento do processo que terá o nome deste, e que passava por três exposições simultâneas monocromáticas, com filtros coloridos distintos, que sobrepostas e tingidas forneciam uma imagem diapositiva a cores. Recorrerá igualmente a outros processos que entretanto irão aparecendo como o Autocromo, dos irmãos Lumière, o Dioptícromo de Louis dufay, ou o processo Paget, patenteado por G. Sidney Whitfield.

Senhora de saúde frágil, Sarah Acland irá com alguma frequência, durante o inverno, rumar a espaços de clima mais agradável que o inglês. E à semelhança do que fizera antes o seu pai, optará várias vezes pela ilha da Madeira. Será aí que, nas duas primeiras décadas de novecentos, realizará algumas das mais antigas fotografias a cores feitas em território português.
























Sarah Angelina Acland, Foguetes (Kniphofia uvaria), diapositivo Sanger Shepherd, Madeira, cerca de 1905
imagem obtida aqui 

Como curiosidade, pode-se acrescentar que gozava da fama de ser uma poliglota, e que no seu obituário, publicado no The Times, de 4 de Dezembro de 1930, este facto é salientado indicando que, entre outras línguas, dominava até o português.

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sexta-feira, 5 de novembro de 2010

ONTOS - vespa vulgaris

Eis uma fotografia da 55º exposição anual da Royal Photographic Society of Great Britain, em 1910. O autor foi Phillip J. Barraud, membro da  Royal Entomological Society.




Phillip J. Barraud, Queen Wasp -Vespa vulgaris , 1910
imagem obtida aqui

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